27 de outubro de 2010

Um poema de Ramos Rosas


Caminha para a minha fronte

Poderemos acaso erguer uma torre de sossego

como se estivéssemos no interior do mundo?

Nós somos descendentes dos répteis
e por isso amamos o letargo solar entre sombras vegetais
Poderíamos assim ouvir o rumor da ausência
como um rosto entre longínquas nascentes
e a pulsação das pedras o obscuro júbilo do fogo
o sorriso cintilante de um regato
Estaríamos na intimidade do olvido
como a pura ignorância de uma sombra lúcida
Seríamos uma erva escrita pela saliva da terra
numa adequação vibrante e sóbria
Veríamos ascender o obscuro em lâmpadas nuas
e toda a espessura seria dúctil e porosa
A identidade encontraria a origem numa flora leve
a hospitalidade de uma terra
nas constelações de argila de basalto e esterco

Nem sempre é fácil a compreensão das poesias de Ramos Rosa, logo à primeira leitura, notadamente em razão da ambigüidade resultante do enfoque metafísico e da presença de elementos conflitantes que estabelecem relações de antagonismo no poema.

A composição “Caminha para a minha fronte” principia com uma indagação do poeta para a qual não pretende encontrar respostas, porque sabe que estas não virão, simplesmente por não terem existência. Sua indagação não passa de mero pretexto para suas ponderações acerca do que nos homens é desumano.

A intencionalidade da sua mensagem, no entanto, é expressar a sua preocupação de ordem metafísica. Todavia, a presença de idéias antagônicas joga-nos no campo das suposições, numa procura de do que há de insondável e velado na subjetividade do ser humano. 

Zenóbia Collares Moreira



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